Menina de Campinas tem síndrome ultrarrara que afeta 1 em 53 milhões no mundo; entenda
06/07/2025
(Foto: Reprodução) Síndrome de Skraban-Deardorff é causada por uma mutação no gene WDR26, localizado no cromossomo um, e afeta o desenvolvimento neurológico, motor e da fala. Helena foi diagnosticada aos 4 anos. 21 casos no Brasil: menina convive com síndrome rara que afeta fala e desenvolvimento
Em um mundo de 8,09 bilhões de habitantes, apenas 150 vivem com a síndrome de Skraban-Deardorff. Isso equivale a uma pessoa a cada 53 milhões. No Brasil, 21 indivíduos possuem a condição, segundo a médica geneticista Vera Lúcia Gil da Silva Lopes, da Unicamp.
Em Campinas (SP), Helena, de 7 anos, é um dos poucos casos conhecidos. Ednir Luís Pedro Nigra Júnior explica que o diagnóstico veio quando a filha tinha quatro anos, após uma série de investigações médicas iniciadas ainda no primeiro ano de vida.
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De acordo com a geneticista da Unicamp, a condição é causada por uma mutação no gene WDR26, localizado no cromossomo um, e afeta o desenvolvimento neurológico, motor e da fala.
No Dia de Conscientização da Síndrome de Skraban-Deardorff, celebrado neste domingo (6), o g1 aborda os sintomas característicos da condição, além do caminho até o diagnóstico de Helena, e o motivo por ela ser considerada ultrarrara.
Nesta reportagem você vai ler ⬇️
Primeiros sinais após o nascimento
'Meu mundo caiu naquele momento'
Condição é considerada ultrarrara
Incentivo ao desenvolvimento
Escola, adaptação e inclusão
Alegre e com vontade de aprender
Helena durante o primeiro ano de vida
Valéria Abrás
Primeiros sinais após o nascimento 🍼
Segundo Edinir, os primeiros indícios de que havia algo diferente apareceram logo após o nascimento. Helena não conseguia mamar no peito e apresentou refluxo nasal durante a alimentação com copinho.
Os sinais indicaram uma condição comum da síndrome: a fenda palatina, que foi identificada pela equipe médica ainda no hospital.
No primeiro ano de vida, Helena precisou usar sonda nasogástrica para conseguir atingir o peso necessário para a cirurgia de correção, feita no Hospital Sobrapar em Campinas.
Edinir explica que a bebê apresentava dificuldades para ganhar peso e demorou cerca de um ano até que atingisse os sete quilos esperados.
Conforme Helena crescia, os pais passaram a perceber outros sinais, como atrasos motores e na fala, também comuns da condição.
“Ela começou a andar com auxílio da fisioterapia e só no limite da idade esperada”, relata o pai.
Segundo Edinir, diante do quadro a neuropediatra que acompanhava a menina desde os primeiros indícios recomendou uma investigação genética mais profunda. Após exames iniciais, foi realizado o exoma (exame genético), que revelou uma mutação no gene WDR26, associado à síndrome de Skraban-Deardorff.
Apesar das investigações desde os primeiros meses de vida, o diagnóstico se concretizou apenas quatro anos depois. A demora está relacionada à raridade da condição que, segundo o pai, é pouco conhecida até entre os médicos.
"Ela pediu para a gente pelo menos três meses para entender o que era aquilo que estava diante dela, que ela nunca tinha ouvido falar", contou o pai sobre a neuropediatra.
'Meu mundo caiu naquele momento'
De acordo com Mariele, mãe da menina, o impacto da notícia foi grande. Apesar de ela já observar que havia "algo fora do esperado" com a filha, o diagnóstico assustou.
“Pelo menos para mim, como mãe, né? O meu mundo caiu naquele momento. Eu chorei uns três dias sem parar, mas depois a gente levanta a cabeça e tem que continuar”, disse.
Mariele conta que possuía esperança de que os sintomas fossem passageiros e que, com o passar do tempo, poderiam se regularizar.
"No fundo havia uma esperança de que fosse algo da infância, passageiro, e que iria se regularizar com o tempo, né? Que aquele atraso ia passar [...] Mas quando você pega um diagnóstico, né? Aquela idealização do filho, que a gente tem normalmente, né? Um filho, vamos dizer assim, perfeito, né? Aquilo caiu por terra e é como se tivesse sido um luto mesmo", relatou Mariele.
Condição é considerada ultrarrara
A geneticista da Unicamp explica que a síndrome de Skraban-Deardorff é uma condição genética considerada ultrarrara, com apenas cerca de 150 casos descritos no mundo até o momento.
De acordo com a médica, o diagnóstico ainda é desafiador pois os sinais clínicos são sutis e não há um padrão evidente que permita suspeitar da síndrome apenas pelo exame físico.
“São crianças que têm atraso de desenvolvimento, podem ter hipotonia, quer dizer, são crianças mais molinhas, com atraso de fala, com algumas características autistas, mas que têm um comportamento geralmente associado a ser crianças alegres, comunicativas, sociáveis, apesar da falta de fala da maioria dos casos”, explica.
Segundo Vera, a condição é geralmente identificada a partir da investigação de atrasos no desenvolvimento e na fala por meio de exames genéticos, principalmente o exoma.
“Até este momento, ela é detectada porque se investiga um quadro de déficit intelectual, de atraso de fala, por meio do exoma, e acaba sendo um achado de exame. Aí, quando você vai relacionar o achado do exame com o quadro clínico, fala: 'Ah, realmente faz sentido ser Síndrome de Skraban-Deardorff'. Então, não é uma situação que você reconhece pelo exame físico. Você fala:' Eu já sei o que é, só vou pedir o exame confirmatório'. Aqui não, mas é uma condição que é considerada ultra rara”, afirma.
A ausência de sinais específicos e o número reduzido de casos dificultam a construção de uma “linha evolutiva” da síndrome.
Ainda segundo a médica, a maioria dos casos identificados ocorre por mutações espontâneas, ou seja, que surgem pela primeira vez naquela gestação, sem herança genética familiar.
Incentivo ao desenvolvimento 🤝
De acordo com Edinir, Helena é acompanhada atualmente por uma rede de profissionais. A rotina inclui fonoaudiologia, fisioterapia, terapia ocupacional e a chamada terapia ABA, voltada para o desenvolvimento de habilidades cognitivas e comportamentais.
Além disso, ela é atendida por pediatra, neuropediatra, psiquiatra infantil, fisiatra, otorrino e oftalmologista. O Hospital Sobrapar também segue com acompanhamento após a cirurgia de correção da fenda palatina.
Segundo os pais, todas as terapias foram iniciadas antes mesmo da confirmação do diagnóstico e foram cruciais para o desenvolvimento da menina.
"Todo esse suporte, já estava sendo fornecido pra ela antes mesmo de saber da síndrome. Então, graças aos médicos que antes do diagnóstico, já observaram com seus olhares clínicos e falaram: 'olha, vamos seguir nesse caminho sem a gente saber o que tem, porque é o que ela precisa nesse momento'", disse Edinir.
Helena frequenta uma escola pública no Jardim Boa Esperança, em Campinas
Arquivo pessoal
Escola, adaptação e inclusão 📚
Helena frequenta uma escola pública no Jardim Boa Esperança, em Campinas. Segundo Edinir, a filha conta com o apoio de uma professora de educação especial, uma cuidadora e uma estagiária que atua exclusivamente com ela.
De acordo com ele, a menina ainda usa fraldas e não desenvolveu habilidades verbais, mas isso não é um empecilho para a boa convivência com as outras criança.
"As crianças entendem que ela é uma criança diferente, vamos utilizar esse termo, que precisa de cuidados [...] adotaram a Helena como se fosse uma irmãzinha. Então, estão sempre junto com ela", contou Edinir.
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Alegre e com vontade de aprender😄
Segundo os pais, a filha tem sido uma grande fonte de aprendizado. Mesmo com limitações, Helena demonstra alegria, resistência e vontade de aprender.
“Por toda dificuldade que ela tem, já perceberam que é esse sorriso sempre no rosto. Sempre brincando, sempre feliz. Outra coisa. Ela tem uma resiliência muito grande. Eu vejo nas sessões de terapia ela se esforça pra aprender”, afirma Edinir.
Para a mãe, em meios às dificuldades, as pequenas conquistas da menina são grandes vitórias para a família. A falta de expectativa que antes era descrita como luto, hoje renasce e se transforma em amor e aprendizado.
"É como se a gente ganhasse uma Copa do Mundo toda vez que ela aprende alguma coisinha nova, alguma gracinha, seja apontar uma coisa que ela quer, sabe? Isso para nós é uma felicidade que não cabe no peito. Porque a gente vê que está evoluindo, devagarzinho, mas ela está sempre progredindo. Ela nunca parou de caminhar, né?", completou Mariele.
Mariele, Helena e Edinir.
Isabella Monteiro
*Sob supervisão de Fernando Evans
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